Breve comentário da decisão do Supreme Court da Holanda no caso Urgenda Foundation v. The State of the Netherlands


    Este caso paradigmático tem vindo a ser debatido desde 2015, no seguimento de um processo instituído pela Urgenda Foundation [1] contra o próprio Estado Holandês, tendo em conta que o mesmo não estava a tomar as medidas necessárias para reduzir as emissões de CO2 entre 25% a 40% até 2020, comparado às emissões de 1990, conforme se tinha vinculado no Anexo 1 da Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas [2].

    Considero que o impacto mundial deste caso se deveu à forma pioneira, de como se harmonizou no mesmo plano, a política nacional e internacional com dados científicos, para chegar a uma decisão que protagoniza a proteção do meio-ambiente através da proteção dos direitos humanos. 

    Desenvolvendo o cerne da questão, cabe referir que os argumentos invocados pela Urgenda Foundation foram essencialmente dois direitos humanos e fundamentais- a vida e a proteção da reserva da vida privada e familiar, nos termos dos artigos 2º e 8º da CEDH, respetivamente. Tendo em conta que, à semelhança da Constituição portuguesa, a Constituição holandesa também prevê o princípio do primado da UE, portanto, a partir do momento em que o Estado reconhece que as alterações climáticas são uma ameaça real e iminente, este tem o dever de tomar as medidas necessárias para prevenir ao máximo esta ingerência destrutiva e impactante na vida dos seus cidadãos.  A decisão do Supreme court de 20 de dezembro de 2019, vem confirmar o que já havia sido proclamado pelo Court of Appeal de Haia em 2018, que se traduz numa obrigação do Estado Holandês, cumprir com a redução do mínimo comunitariamente estabelecido, de 25% das emissões até 2020, complementando a decisão anterior com o art.13º da CEDH, sendo que o Estado está ainda obrigado a promover uma tutela legal efetiva dos direitos dos seus cidadãos.

    Apenas acrescentaria que seria interessante se tivesse havido um recurso ao TEDH, na medida em que um parecer comunitário seria um contributo enriquecedor para a jurisprudência da UE na mitigação das alterações climáticas à luz de relevantes direitos humanos e direitos fundamentais, não obstante o fator temporal de ser no melhor interesse das partes que a decisão do Supreme court saísse antes de 2020.

    É inegável que cada Estado tem a sua quota parte de responsabilidade no problema global das alterações climáticas, sendo que esta decisão contribuiu para que o Parlamento holandês procedesse à adoção do Climate Act e à aceitação do Climate Agreement. Em suma, o Urgenda case foi um cataclismo para o aparecimento destes novos instrumentos de combate às alterações climáticas na Holanda, tendo também consciencializado mundialmente outras nações, com este grande sucesso e contributo para a litigância climática de muitos outros casos, tendo como base a proteção de direitos humanos e fundamentais.


 [1] Fundação que desenvolve medidas de prevenção das alterações climáticas, representada por 886 cidadãos no presente caso;

 [2] Importância dos relatórios do IPCC, uma organização intergovernamental que integra o corpo científico da ONU- este é que previu para os países do Anexo I, uma redução de 25% a 40% das emissões até 2020, e 80% a 95% até 2050, em comparação com as emissões de 1990;

                                                                                                                         Alanan Malú, nº62841

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