Comentário ao Acórdão do TCA Sul – Ruído por festividades em Loulé

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O conflito em questão dá-se entre o Município de Loulé e um particular que vive nesse local e, que alega ser vítima de todo o ruído produzido pelos imensos eventos que o Município tem vindo a autorizar ao longo dos anos.

O caso trata o recurso de uma outra ação na qual a decisão do TCA foi a de considerar a ação interposta pelo particular como meio procedente. Esta decisão deu-se porque, ainda que se tenha comprovado a existência de eventos que produziam ruído que perturbam a esfera jurídica de cidadãos como o requerente, não é possível determinar ao certo se o nível de ruído ultrapassou o permitido por lei. Deste modo, ao Município de Loulé caberia a tarefa de realizar medições acústicas para apurar os “valores limites de exposição ao ruído”.

A consagração do direito fundamental ao ambiente veio a permitir o reconhecimento dos particulares enquanto sujeitos de direito nas relações ambientais e permite que estes venham exercer este seu direito constitucionalmente protegido pelo art.º 66º CRP. A importância deste facto é o de que na leitura do acórdão, o particular veio a invocar esses direitos protegidos, nomeadamente, o direito ao sossego, ao repouso, à tranquilidade, à saúde, e outros, todos tendo por base queixa de que a existência sucessiva e anual de eventos ruidosos numa zona habitacional tem vindo ao longo dos anos a degradar a qualidade de vida deste cidadão.

Ainda que o tribunal tenha concordado que as queixas do particular tenham fundamento, porque “a realização de atividades ruidosas em zonas habitacionais não é uma atividade livre, nem incondicionada, impondo a emissão do juízo da excecionalidade das circunstâncias e a consideração do valor da tranquilidade das populações”, parece que, na verdade nada fica protegido, uma vez que, para comprovar a ilegalidade do ruído não basta a alegação do dano especial e anormal, é necessária a sua verificação a nível de decibéis, um mero pormenor administrativo quando em causa estão bens maiores.

Ora, esta decisão parece não ir de encontro à menção que se fez do direito do ambiente enquanto um direito dos particulares. Temos em conta os factos relatados pelo particular: palcos posicionados a 5 metros de distância das janelas das residências na Praça do Mar; existência de 30 altifalantes; duração de um mês; o evento ultrapassa o horário permitido para o ruído.

Com estas informações, torna-se difícil comentar este acórdão de outra forma senão discordando com a conclusão a que os tribunais chegaram. Perante todos os factos, seria absurdo não reconhecer ao particular toda a razão, no sentido de que, independentemente do nível de som que o ruído atinja, a recorrente autorização de licenças de ruído para eventos neste Município tem conduzido a um desgaste da qualidade de vida deste particular e da sua família.

Sendo este um problema de direito do ambiente, a única solução seria a de que o julgador priorizasse a proteção dos direitos fundamentais do particular protegidos pela CRP, ao invés de continuar a permitir a existência destes festivais.

Sara Aguiar, nº62866


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