Comentário ao Caso Gert Folk, C-529/15

No Caso C-529/15, o TJUE foi chamado a interpretar diversas disposições da Diretiva da Responsabilidade Ambiental (Diretiva 2004/35/CE22). O pedido de reenvio emergiu de uma ação com vista à efetivação de responsabilidade civil ambiental, intentada por um titular de uma licença de pesca no rio Mürz, na Áustria, com fundamento em atentados ao ambiente, provocados por uma central hidroelétrica, que comprometiam a reprodução natural dos peixes. O órgão administrativo austríaco competente indeferiu a ação com o argumento de que tendo a exploração da central hidroelétrica sido autorizada nos termos da legislação nacional, o dano invocado não podia ser qualificado como dano ambiental nos termos da Diretiva.

O Tribunal declarou que o artigo 17.º da Diretiva deve ser interpretado no sentido de que a Diretiva se aplica ratione temporis aos danos ambientais que ocorreram depois de 30 de abril de 2007, mas que foram causados pela exploração de uma instalação autorizada (no caso, nos termos da legislação sobre as águas), que estava em atividade antes dessa data.

De seguida, o TJUE afirmou que a Diretiva – em especial o seu artigo 2.º/1/b) que define “dano ambiental”, densificando-o por componentes naturais – deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma disposição de direito nacional que exclui, de forma geral e automática, que um dano que produz efeitos significativos adversos no estado ecológico, químico ou quantitativo ou no potencial ecológico das águas afetadas possa ser qualificado de «dano ambiental» pelo simples facto de estar abrangido por uma autorização concedida em aplicação desse direito.

Ademais, considerou que os artigos 12.º e 13.º da Diretiva devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma disposição de direito nacional, como a que estava em causa no processo principal, que proíba os titulares de uma licença de pesca de interpor um recurso relativo a um dano ambiental, na aceção do artigo 2.º/1/b) da Diretiva. O TJUE observou que os Estados-Membros não têm margem de apreciação no que toca ao direito de recurso das pessoas afetadas ou suscetíveis de ser afetadas por danos ambientais, como decorre do artigo 12º/1/a).

Por fim, note-se que esta decisão não se refere explicitamente à Convenção de Aarhus para chegar às suas conclusões, todavia, como refere o Advogado-Geral Bobek, os artigos 12º e 13º da Diretiva têm-na como modelo, nomeadamente o artigo 9º/2 e 3. Assim, a UE tem caminhado para um direito comunitário mais densificado em matéria ambiental, concretizando o que se atingiu internacionalmente, a meu ver positivamente, dados os problemas de enforcement que inerem ao direito internacional e a UE estar dotada de outros mecanismos.

A jurisprudência do TJUE revela uma abordagem pragmática e flexível na interpretação dos objetivos dos Tratados, que tem influenciado positivamente a política ambiental europeia, neste caso, permitindo que danos pretéritos e sob autorização sejam ainda considerados danos ecológicos para efeitos de responsabilidade ambiental.

Juliana Figueiredo Reis nº 63104

 

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