Poluição sonora no Direito Português
Inicialmente, importa falar que não se trata de uma matéria atual no ordenamento jurídico português, visto que, desde 1987 é possível encontrar a matéria de prevenção de ruído e controle da poluição sonora sendo regulada em tal ordenamento por meio da Lei n.º 11/87, de 11 de Abril (Lei de Bases do Ambiente), e do Decreto-Lei que aprovou o primeiro regulamento geral sobre o ruído, a saber o Decreto-Lei n.º 251/87, de 24 de Junho. Atualmente, a regulação da produção de ruído ambiental em Portugal é assegurada pelo Regulamento Geral do Ruído (RGR).
Consoante o Regulamento Geral do Ruído, constitui-se como tarefa fundamental do Estado a prevenção e o controle da poluição sonora de modo a visar a proteção da saúde humana e bem estar das populações, de acordo com o disposto na Constituição da República Portuguesa e na Lei de Bases do Ambiente.
O âmbito de aplicação do RGR, conforme seu artigo 2°, é para as atividades ruidosas permanentes e as temporárias, bem como outras fontes de ruídos que são propensas a causar incômodo, como por exemplo obras de construção civil, sistemas sonoros de alarme, espetáculos, diversões, manifestações desportivas, feiras e mercados, dentre outras situações. Bem como, é aplicável ao ruído de vizinhança, conforme o artigo 2°, número 2° do Regulamento.
Conforme o Regulamento Geral do Ruído, é possível dividir e definir dois tipos de atividades que são ruidosas: a permanente e a temporária. A atividade ruidosa permanente, de acordo com RGR, é “a actividade desenvolvida com carácter permanente, ainda que sazonal, que produza ruído nocivo ou incomodativo para quem habite ou permaneça em locais onde se fazem sentir os efeitos dessa fonte de ruído, designadamente laboração de estabelecimentos industriais, comerciais e de serviços”. Por sua vez, segundo o RGR, a atividade ruidosa temporária é definida como “a actividade que, não constituindo um acto isolado, tenha carácter não permanente e que produza ruído nocivo ou incomodativo para quem habite ou permaneça em locais onde se fazem sentir os efeitos dessa fonte de ruído tais como obras de construção civil, competições desportivas, espectáculos, festas ou outros divertimentos, feiras e mercados”.
O artigo 11° deste Regulamento, se mostra de grande relevância, uma vez que define valores limite de exposição que devem ser obedecidos de acordo com o tipo de zona. Tal artigo foi, inclusive, objeto do post anterior no blog “Ruído por festividades em Loulé". Outro cenário envolvendo esse tema é a situação que envolve o aeroporto de Lisboa, o Aeroporto Humberto Delgado. Em julho de 2022, a associação ambientalista Zero denunciou sobre os níveis de ruído junto ao aeroporto de Lisboa que ultrapassaram os limites impostos pela lei, assim como, que o regime de restrição de voos noturnos que não estava sendo cumprido. Conforme o artigo 20° do Regulamento Geral do Ruído - RGR que versa sobre o Funcionamento de infra-estruturas de transporte aéreo, são proibidas nos aeroportos e aeródromos a aterragem e a descolagem de aeronaves civis entre as 0 e as 6 horas, salvo por motivo de força maior. Podendo ser permitida a aterragem e a descolagem de aeronaves civis entre as 0 e as 6 horas nos aeroportos e aeródromos que disponham de um sistema de monitorização e simulação de ruído que permita caracterizar a sua envolvente relativamente ao L(índice den) e L(índice n) e determinar o número máximo de aterragens e descolagens entre as 0 e as 6 horas, de forma a assegurar o cumprimento dos valores limite fixados no artigo 11º. O ruído causado pelos aviões afeta várias pessoas, em especial os hospitais, as escolas, bibliotecas, universidades, a exemplo da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, que de forma frequente tem as suas aulas interrompidas, de forma momentânea, pelo ruído. Assim como, afeta o sono e o bem estar de vários moradores que habitam nas proximidades do aeroporto.
Em 2023, foi divulgado que a APA, Agência Portuguesa do Ambiente, irá aplicar sanções à ANA - Aeroportos de Portugal caso não cumpra medidas de redução de ruído. Também foi anunciado em janeiro que a ANA irá avançar com o financiamento para isolar fachadas de 22 edifícios que são considerados sensíveis com o objetivo de diminuir os impactos do ruído dos aviões em Lisboa e Loures e após, a medida deverá ser implantada para os edifícios habitacionais. Tal plano de ação de ruído, que está em vigor de 2018 até 2023, contempla o isolamento de fachadas deve respeitar o princípio do poluidor-pagador no financiamento dessa medida. O princípio do poluidor-pagador é um princípio de natureza econômica que além de estar previsto no artigo 174°, n°2 do Tratado da União Europeia, também possui natureza constitucional, “uma vez que representa um corolário necessário da norma do artigo 66°, n°2, alínea h da Constituição, que impõe ao Estado a tarefa de <<assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com ambiente e qualidade de vida>>” (VASCO PEREIRA DA SILVA). Tal princípio decorre da “consideração de que os sujeitos económicos, que são beneficiários de uma determinada actividade poluente, devem igualmente ser responsáveis, pela via fiscal, no que respeita à compensação dos prejuízos que resultam para toda a comunidade do exercício dessa actividade” (VASCO PEREIRA DA SILVA). Resumidamente, por esse princípio, aqueles que utilizam bens ambientais em sua atividade econômica, devem compensar a comunidade por suas ações.
Em conclusão, é possível perceber que há uma norma, a saber o Regulamento Geral do Ruído, que tem por objetivo prevenir e controlar a poluição sonora, contudo nem sempre na prática ela vem sendo observada, como no caso dos ruídos provocados pelo Aeroporto de Lisboa. Também, é possível concluir que é necessário que medidas sejam tomadas devido às consequências negativas causadas pelo ruído, uma vez que ela afeta o bem-estar, a qualidade de vida, o sono, aprendizagem, etc.
Beatriz Cunha Brito
Bibliografia:
SILVA, Vasco Pereira da. Verde Cor de Direito Lições de Direito do Ambiente. Lisboa, ALMEDINA, 2002.
Regulamento Geral do Ruído. Disponível em: https://dre.pt/dre/legislacao-consolidada/decreto-lei/2007-34526375
Comentários
Enviar um comentário