Princípios de Direito do Ambiente, O Princípio da Prevenção e Precaução, em especial
São vários os princípios que operam no plano do Direito
do Ambiente, tendo eles como grande função, desde logo sistematizar as normas
deste ramo de Direito, considerando a sua realidade de fragmentação. Para além
disto, os princípios tendem a estar consagrados nas Constituições dos vários
países, de forma a auxiliarem a planificação dos deveres estatais a nível
ambiental. Por fim, os princípios são, ainda, fundamentais para limitar
qualquer tentativa de discricionariedade da ação administrativa, pois obrigam a
uma ponderação criteriosa dos interesses em causa em cada situação concreta.
Na Constituição da República Portuguesa (CRP daqui
adiante), são vários os princípios consagrados, que se destinam à proteção
ambiental, veja-se o princípio de desenvolvimento sustentável (artigo 66º/2/b)),
com uma importância crescente nos dias que correm, relativamente ao tema da
solidariedade intergeracional; o princípio do poluidor-pagador (artigo
66º/2/h)); o princípio do aproveitamento racional dos recursos humanos (artigo
66º/2/d)); o princípio da prevenção e precaução (artigo 66º/2/a)). Esta
consagração constitucional de diversos princípios ambientais era
imprescindível, tendo por base a tutela do ambiente, enquanto tarefa
fundamental do Estado, nos termos do artigo 9º, todos eles da CRP.
No presente post, vamos debruçar-nos sobre a análise
do Princípio da Prevenção e Precaução, a nosso ver, um dos princípios fulcrais
em sede de direito ambiental. Além da consagração constitucional já referida, o
princípio vem previsto no texto do artigo 3º/a) da Lei de Bases Ambiental. O
seu conteúdo prende-se com a impedição de lesões ao meio ambiente, sejam elas de
origem natural ou de atuação humana, partindo da premissa de que é necessário antecipar
as situações potencialmente perigosas, através de um juízo de prognose, de
forma a permitir-se a adoção de atuações e medidas idóneas a afastar tais
potenciais ocorrências ou, pelo menos, a diminuir o impacto das suas
consequências.
Num sentido amplo, o princípio da prevenção e precaução comporta
consigo a missão de afastar riscos futuros, ainda que não sejam determináveis. Por
outro lado, numa vertente restritiva, o princípio em causa pretende evitar os
perigos que sejam já imediatos e concretos. Dentro desta lógica dualista, alguma
doutrina tem tido a tendência de autonomizar a vertente restritiva do princípio,
fazendo nascer o princípio da prevenção, retirando-lhe, portanto, a vertente de
precaução.
Seguindo este raciocínio de autonomização, encontramos,
desde logo, o Professor Gomes Canotilho, que coloca como preocupação central o
evitar da ocorrência de danos, antes destes terem hipótese de se tornarem
efetivos. A seu ver, fará mais sentido este sentido de prevenção do que a
lógica subjacente à precaução, que é, no fundo, contabilizar os danos e
repará-los de forma eficaz, na medida em que, na maioria das situações, essa
dita reparação já nem se concretiza como possível, exemplo clássico disso é a
extinção de uma espécie animal. Posto isto, acresce o fator financeiro, visto
que a reparação implica custos muito mais elevados do que a prevenção. Contudo,
o Professor Gomes Canotilho entende que o princípio da precaução pode elevar a
própria proteção do ambiente a outro nível, nomeadamente, nos casos de colisão
de duas ou mais realidades importantes onde se gere dúvida sobre qual deve
prevalecer, em função da restrição da(s) restante(s). Ora, nestes casos de
confronto, o Ambiente deve ter a seu favor o benefício da dúvida, sempre que
existam incertezas quanto ao nexo causal entre o exercício de determinada
atividade e certa lesão ambiental, é o chamado in dubio pro ambiente.
Em lado diverso da discussão, encontramos o Senhor
Professor Regente Vasco Pereira da Silva, que se faz acompanhar, aliás, pela
Senhora Professora Carla Amado Gomes nesta posição ampliativa do princípio da
prevenção e precaução. Assim, os professores pugnam por uma ideia que abarque
os riscos naturais, os perigos humanos, assim como a antecipação de lesões
ambientais atuais e futuras, parametrizando-se esta abrangência segundo critérios
de razoabilidade e bom senso. Soma-se, ainda, o elemento semântico das palavras
prevenção e precaução, que são sinónimas entre si, o que pode gerar problemas e
confusões desnecessárias ao nível da interpretação. A Professora Carla Amado
Gomes chama, inclusive, a atenção para uma interpretação sistemática da nossa
Constituição, na medida em que, se esta prevê expressamente o princípio da
prevenção, então, deverá fazer-se uma ponderação cuidadosa e até agravada entre
o interesse ambiental e outro(s) interesse(s) que esteja(m) em causa num
eventual conflito, nomeadamente, quando, do outro lado da balança se encontrem
interesses de ordem financeira ou económica.
Em suma e fazendo uma reflexão própria, parece-nos que o
raciocínio inerente à construção de um princípio de prevenção amplo fará mais
sentido, pois torna a sua aplicação prática ao caso concreto mais eficiente,
para além de que, deixa confusões semânticas de fora da discussão, de forma a
que não sejam trocados os dois conceitos. Por fim, não nos podemos esquecer que
o foco principal aqui é a proteção do Ambiente, proteção essa que deve
concretizar-se num esforço ex ante, pondo de lado correr riscos que
possam advir de uma atuação apenas ex post, que, como vimos, poderá
levantar grandes dificuldades de efetivação, pelo que, nestes casos será mesmo
melhor agir segundo o ditado português “mais vale prevenir do que remediar”.
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