Simulação de Julgamento - Promotores

 



FACULDADE DE DIREITO - UNIVERSIDADE DE LISBOA

LICENCIATURA EM DIREITO

 

 

 

 

 

 

ANA BEATRIZ SOARES, GABRIELA PORTUGAL CORDEIRO, LUIS VEIGA DA CUNHA E SOFIA CADIDÉ SOUZA DIDIER

DIREITO AMBIENTAL - SUB-TURMA 8

 

 

 

 

 

SIMULAÇÃO DE JULGAMENTO

 

 

 

 

 

 

Lisboa

2023


Excelentíssimos Senhores Doutores Juízes de Direito do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja 

Processo n.º 2729/23 

Autores: Dunas Sem betão

Réu: Viva Verde entre as Dunas

Viva Verde entre as Dunas, (pessoa coletiva, empreendimento turístico, integrante das sociedade unipessoais “Sem Cheta e com Amigos” I, II e III, com NIPC 987543-76654, e contrato social registrado no município de Grândola), por intermédio dos seus advogados  (Ana Beatriz Soares, Gabriela Portugal Cordeiro, Luis Veiga Da Cunha e Sofia Cadidé Souza Didier), vem apresentar a sua CONTESTAÇÃO, nos termos e com os fundamentos seguintes:

I. DOS FACTOS:

1.º

O promotor imobiliário “Viva Verde sobre as Dunas” deu início às obras de construção de um empreendimento turístico privado na praia de Troia, após a declaração de interesse público efetuada pelo município de Grândola que afastava a suspensão automática das obras antes existentes.

2.º

Em momento posterior, houve uma providência cautelar interposta pela Associação ambientalista “Dunas sem Betão” 

3.º

Deste modo, as autoridades da câmara municipal e o promotor imobiliário “Viva Verde sobre as Dunas” alegaram a importância do novo empreendimento para o desenvolvimento econômico da região, justificando a sua prévia qualificação administrativa como de Potencial Interesse Nacional (PIN).

4.º

Além do mais, alegou-se que todos os desmatamentos e movimentações de terras já foram efetuados na região, não gerando novos danos para o meio-ambiente, o que levou ao arquivamento das coimas impostas pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo.

5.º

Logo, foi entendido que qualquer litígio judicial que dissesse respeito ao empreendimento turístico em questão, seria indeterminado

II. DO DIREITO:

2.1. Defesa por Exceção (Ausência de legitimidade dos autores):

6.°

O Artigo 571.º do Código de Processo Civil elucida os estatutos da defesa por impugnação e defesa por exceção. Invoca-se, na presente contestação, a defesa por exceção.

Nesse âmbito, o réu defende-se por exceção quando alega factos que obstam à apreciação do mérito da ação ou que, servindo de causa impeditiva, modificativa ou extintiva do direito invocado pelo autor, determinam a improcedência total ou parcial do pedido.

Questiona-se a legitimidade do autor. O Código de Processo Civil discorre sobre legitimidade das partes no Artigo 30.º (art.º 26.º CPC 1961), dizendo-se o conceito de legitimidade para o autor ser: “quando tem interesse direto em demandar”. Ainda, o “interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação”.

Não obstante, o Artigo 31.º (art.º 26-A.º CPC 1961) esclarece o proceder em relação às ações para a tutela de interesses difusos. Garante-se que têm legitimidade para propor e intervir “nas ações e procedimentos cautelares destinados, designadamente, à defesa da saúde pública, do ambiente, da qualidade de vida, do património cultural e do domínio público, bem como à proteção do consumo de bens e serviços, qualquer cidadão no gozo dos seus direitos civis e políticos, as associações e fundações defensoras dos interesses em causa, as autarquias locais e o Ministério Público, nos termos previstos na lei”. 

7.°

O que se sucede aqui, visando alegar a falta de legitimidade, não é desmerecer a importância e função das associações, mas sim relembrar que há uma limitação de interesse territorial para sua atuação. Há falta de legitimidade dos autores (Dunas Sem betão) para esta ação. A legitimidade para participar de processos legislativos e administrativos varia a depender da qualificação, e não é qualquer organização que pode interferir em questões ambientais locais do município de Grândola, apenas associações locais com interesse direto. Fica evidente a ausência dessa qualificação, estando os autores sem legitimidade para a ação, situação que obsta à apreciação do mérito da ação, sendo uma causa impeditiva que deve levar à improcedência total do pedido. 

2.2. Proporcionalidade e Razoabilidade:

8.°

Em primeiro plano, observa-se que os bens e valores fundamentais do meio ambiente devem ser avaliados e ponderados em relação a outros, ou seja, não é possível olvidar do cuidado ecológico, mas também não se pode deixar de lado bens e valores econômicos. Nesse contexto é necessário uma  avaliação baseada na proporcionalidade, pois para além de aumentar o desenvolvimento turístico na região, o projeto contribui para ampliação de mão de obra local. Essas consequências para a economia estão diretamente ligadas com uma declaração de interesse público, visto que não há apenas um interesse privado da construtura e este é um projeto que pode beneficiar toda uma região. 

9.°

É importante destacar também que a Lei de Bases abriga em seu artigo 13, um parágrafo sobre Transversalidade e integração da política de ambiente, “no sentido de promover e acautelar os princípios e objetivos da política de ambiente, os bens ambientais devem ser ponderados com outros bens e valores, incluindo os intangíveis e os estéticos, de forma a assegurar a respetiva interdependência, num exercício de compatibilização que inclua uma avaliação de cenários alternativos, promovendo a realização do interesse público no longo prazo”, sendo que esta impõe a sua consideração em todos os setores da vida econômica, social e cultural, e obriga à sua articulação e integração com as demais políticas sectoriais, visando a promoção de relações de coerência e de complementaridade.

10.°

Acrescenta-se ainda aqui que o projeto encontra-se sujeito a Avaliação de impacto ambiental,  ao abrigo da alínea c) do n° 12 (Turismo) do Anexo II, nos termos da alínea b) do n° 3 do artigo 1 do Decreto-Lei n° 151-B/2012. De 31 de outubro (com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n° 47/2014 de 24 de março e pelo Decreto-Lei n° 179/2015. De 27 de agosto, pela Lei n° 37/2017, de 2 de junho e pelo Decreto-Lei n° 152-B/2017, de 11 de dezembro, que o republica).º

11.°

Da decisão de interromper a execução do projeto, nas circunstâncias em que obra se encontra, ser violadora da segurança jurídica e da proteção da confiança e do princípio da razoabilidade, importa referir inicialmente que o que defendemos não é propriamente que o tribunal aplique a teoria do facto consumado. Esta teoria implica que haja um ato ilegal e que o mesmo se convalide com o decurso do tempo em nome do princípio segurança jurídica. Não é isso que aqui defendemos.

12.°

De fato, o nosso entendimento é que a decisão administrativa de arquivamento (de não as aplicar) funciona como  reconhecimento, por parte da administração, da inexistência de ilegalidade. De outro modo, teria havido sanção. Ora, sabemos que já foram feitas todas as desmatações e movimentações de terras. Significa isto, que a base sobre a qual vai ser edificado o projeto já foi intervencionada, sendo que da continuação da obra é certo que não resultarão quaisquer outros impactos para o ambiente designadamente para o solo.

13.°

Na verdade, interromper agora as obras representaria um atentado à segurança jurídica. Isto porque o demandado atuou sempre no pressuposto de que perante a declaração da Câmara Municipal que afastou a providência cautelar que havia determinado a interrupção das obras e perante o arquivamento das coimas não havia obstáculo à execução do projeto. Entendemos, por isso, que proceder agora, já com as obras em andamento, à interrupção da obra violaria a confiança que o demandado legitimamente depositou na Administração.

14.°

Além disto, se pensarmos que a decisão de interromper a obra seria feita depois dos principais intervenções sobre o solo já terem decorrido, não havendo mais nenhum prejuízo ambiental que a continuação de obra possa causar, esta decisão seria violador do princípio da Razoabilidade, na medida em que se estaria não só violar a segurança jurídica e a proteção da  confiança do administrado, mas também a sacrificar o direito à iniciativa económica do demandado, para salvaguardar um direito ou  efetivar um princípio ( que a outra parte irá invocar) que a nosso ver não pode prevalecer. 

III. Princípios Objetivos Fundamentais

3.1. Prevenção e Precaução

15.°

Segundo o artigo 66.º - (Ambiente e qualidade de vida), da Constituição da República Portuguesa, n° 2 alínea b “Para assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos: b) Ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correcta localização das actividades, um equilibrado desenvolvimento sócio-económico e a valorização da paisagem”

16.°

Refletindo sobre a prevenção e a precaução, cabe sempre ponderar quais atuações têm menor custo ambiental e são mais viáveis. Não faz sentido separar prevenção e precaução, porque há uma lógica em que é preciso considerar os fenômenos ambientais e humanos em conjunto. A avaliação de impacto ambiental precisa de prognóstico, não é possível separar efeitos atuais e efeitos futuros, causas atuais e causas futuras, tudo atua num domínio de concausalidade. 

17.°

Não havendo distinção rigorosa entre prevenção e precaução, e sendo indesejável é impossível separar os conceitos, encontra-se a referência de dois conceitos unidos e ligados. É preciso sempre haver uma análise caso a caso de consequências e vantagens, é preciso encontrar mecanismos de causalidade adequados, usando critérios de ponderações. 

18.°

No quadro de uma sociedade em que há muitos perigos e muito riscos, os fenômenos dos dias de hoje são tão complexos que precisam de uma averiguação minuciosa e clara das causas dos fenômenos. As regras da responsabilidade civil devem ser racionais e adequadas ao princípio da probabilidade, visando olhar para mecanismos objetivos – teoria da causalidade adequada e a responsabilidade civil ambiental. O empreendimento em questão respeita os princípios objetivos fundamentais supracitados.

19.°

Fica provado que o empreendimento não irá causar maiores danos ao meio ambiente. Tudo o que seria desmatado para realização do projeto já foi feito. Cabe ressaltar, que dos 138.280 m2 [metros quadrados] de implantação previstos, só se vão implantar 25.300 m2; de 152.780 m2 autorizados, só se vão edificar 30.504 m2; de 556 unidades de alojamento autorizadas, só se vão construir 118; de 3.242 camas só vão existir 504.

20.°

O empreendimento foi aprovado pelo avaliação ambiental estratégica (AAE), sendo assim, as considerações do foro ambiental já estão incluídas na fase de planeamento e as eventuais consequências já foram aprovadas ou autorizadas, garantindo um elevado nível de proteção ambiental.

21.°

Cumpre ressaltar ainda, que a problemática do princípio de precaução nasceu com ele próprio, na Declaração do Rio de 1992 e dali, contaminou os subsequentes documentos internacionais. O princípio 15 do diploma, na primeira assertiva, coloca que a finalidade do princípio da precaução é a cláusula aberta “proteger o meio ambiente”, não se importando durante o corpo do texto em explicar os mecanismos tutelares e sua relação com a precaução. 

3.2. Desenvolvimento Sustentável

22.°

Entende-se que é viável haver desenvolvimento turístico com proteção ambiental. O desenvolvimento sustentável, princípio objetivo fundamental, deve ser proporcional aos interesses econômicos e sociais. Os bens e valores fundamentais do meio ambiente devem ser avaliados e ponderados em relação aos bens e valores econômicos e sociais.

23.°

A Constituição da República Portuguesa, em seu artigo 66.º sobre Ambiente e qualidade de vida, em seu número 2, alínea B, diz que incube ao Estado “ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correcta localização das atividades, um equilibrado desenvolvimento socioeconómico e a valorização da paisagem”. Portanto, o desenvolvimento socioeconômico não aparece como inimigo do desenvolvimento sustentável, estando enquanto complementares.

24.°

O princípio do desenvolvimento sustentável nasceu como de natureza econômica, não de natureza jurídica – resume-se em fazer balanço das realidades, evitar consequências ambientais negativamente excessivas. Não há avanços sociais ou econômicos que não tragam consequências ambientais negativas, a questão é apenas evitar que tais consequências sejam excessivas. É preciso sempre fazer a ponderação entre as consequências negativas e as positivas. A proteção ambiental é imprescindível, mas tem que ser compatível com a realidade de desenvolvimento social atual, respeitando o crescimento atual dos países e regiões, portanto, é sempre necessário haver uma análise caso a caso para tomar as medidas mais adequadas. Não se pode ignorar o princípio de realismo jurídico, e vislumbrar a comparabilidade entre consequências boas e más, como forma de decisão. O conteúdo jurídico do princípio é que há um dever de ponderação antes da tomada de decisão para comparar os danos dessa eventual medida para o meio ambiente com as eventuais vantagens que podem surgir no plano factual econômico-social, sendo a avaliação de impacto ambiental justamente ponderada. Ainda, deve-se ter em conta uma clara noção de proporcionalidade. Este princípio é um princípio ativo, e a boa-fé dos réus fica evidente ao notar-se que há uma avaliação de impacto (AIA - Avaliação de Impacto Ambiental) em processo de análise.

Termos em que deve: 

a)      Ser declarada a absolvição do réu da instância, quanto a todos os pedidos, por ilegitimidade ativa (falta que qualificação e interesse direto); e  

b)      caso não seja reconhecida a ilegitimidade ativa, ser declarada a absolvição do réu da instância, por ineptidão das petições iniciais; ou  

c)      caso não seja reconhecida a absolvição de instância, que sejam os pedidos julgados improcedentes e, o réu, absolvido de todos os pedidos. 

 

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